O Twitter está morto. A plataforma hoje conhecida como “X” se parece com o Twitter, pia como o Twitter, e ainda é acessível pela mesma URL. Mas entre todas as mudanças dentro e fora da empresa que aconteceram no último ano, é seguro dizer que a rede como ela era antigamente não existe mais, até porque o dono e a CEO já confirmaram isso várias vezes. A nova administração tenta levar o produto, que já era um desastre anteriormente, em novas direções que, além de tornar a experiência pior, acabam afastando cada vez mais usuários e anunciantes.
A morte do Twitter tem sido sentida ao longo do ano, mas agora que estamos em período de retrospectivas e reflexões sobre os últimos 12 meses, o assunto está vindo mais a tona do que nunca (O The Verge fez um especial sobre isso - link). O Twitter sempre foi uma plataforma “pequena” comparada a outras, mas também sempre teve seu charme. Pra muitas pessoas da minha geração e de perfil “extremamente online”, o Twitter era um lugar tão importante quanto nossa casa, nosso trabalho ou nossa escola/faculdade. Era um local para se conectar com pessoas e acontecimentos. Um local de comunidade. Era um local onde parecia que algo diferente, estranho ou importante, SEMPRE estava acontecendo quando você abria o aplicativo. Era uma parte tão integral do dia-a-dia, que fazia parte da rotina de acordar. Ironicamente, a aquisição do Elon Musk foi o que fez o Twitter deixar de ser “a praça da cidade” como ele mesmo famosamente descreveu.
Numa nota mais pessoal, eu não sei se eu seria quem eu sou atualmente sem esse site. Entrei em maio de 2010, num momento que definiu muito a minha vida. E estar no twitter nesses 14 anos me proporcionou várias coisas: foi lá que eu fiz parte de várias comunidades de pessoas com gostos parecidos que os meus: primeiro foram os fãs de Black Eyed Peas, depois os fãs de Linkin Park, depois os fãs de música eletrônica, mas também futebol, formula 1, Magic The Gathering… Nessas comunidades conheci várias pessoas que hoje considero grandes amigas. Estar no Twitter manteve e acelerou minha paixão por música em geral. Quantas Tomorrowlands, Ultra Music Festival, EDC eu não comentei naquele site? Quantos momentos únicos, como o último show do Swedish House Mafia (na época), que pude acompanhar com pessoas que tinham o mesmo sentimento que eu? Onde mais eu poderia me conectar tão de perto com artistas, comentaristas esportivos, amigos de longa data, e outras pessoas que eu admirava?
Minha história é só uma, e tenho certeza que se eu passar 5 minutos procurando, eu acharia centenas de histórias de vidas mudadas por causa de um tweet. Coletivamente, acompanhamos eleições, vimos o 7-1, e sei lá quantos acontecimentos locais e globais que estouravam primeiro no twitter. Por muitos anos, o trabalho de vários apresentadores de TV era só ler as atualizações do site, e minha opinião já foi parar em inúmeros sites de “notícia” como “a reação dos internautas”. Hoje não se vê mais tanto isso, pois muita gente já fechou a conta lá, e mesmo as empresas que antes eram extremamente interessadas no engajamento que o Twitter abria, agora não acham mais uma boa ideia aproximar a própria imagem da imagem que a X criou para si mesma.
Essa mudança certamente traz um impacto social e cultural que acho que ainda estamos no meio do processo de digerir. E nesse meio tempo, várias empresas surgiram com o desejo de preencher esse vácuo na internet, enquanto muitos de nós pensamos se esse vácuo precisa mesmo ser preenchido.
A razão pra eu estar escrevendo esse texto nesse momento é justamente pra tentar colocar em palavras tudo que está acontecendo na internet, mas também na minha cabeça. Eu não superei o Twitter ainda. Várias vezes nessa semana eu me vi numa situação chata ou peculiar, e meu primeiro pensamento foi um texto em 280 caracteres reclamando do que está acontecendo, as mãos já procurando o celular pra achar o ícone do Twitter. E todas as vezes, eu parei. Primeiro pois não tenho mais o Twitter instalado no celular. Segundo, porque esse não é um hábito saudável. Eu estava muito acostumado a usar essa plataforma como um vazio pra descarregar minhas frustrações, minhas piadas ruins, um pensamento aleatório, sem precisar maturar a ideia nem expandir o pensamento muito mais. A lógica era simples: pensou, postou. As vezes eu ganhava um like ou um retweet. Ótimo, vamos pra próxima. Tudo isso tornou a comunicação muito mais fácil, mas talvez tenha piorado bastante nossa capacidade de nos comunicar. Talvez esse texto não passe de um tweet de 7 mil caracteres.
Mas acho que nem tudo está perdido: a ideia de comunidades federadas é boa, e apesar de eu ter o receio de que ter só um clone do twitter não vai tornar nossa vida digital melhor. Mas a promessa de ter comunidades especializadas, com moderação mais localizada, com menos possibilidade de spams de criptomoeda e sem a necessidade de monetizar todo e qualquer conteúdo, pode se tornar uma saída mais saudável. Eu também tenho voltado cada vez mais minha atenção à Small Web, com blogs pequenos, sites pessoais, conteúdos estranhos, peculiares e particulares de cada pessoa. É nisso que esse blog está inspirado e é isso que eu gosto de ver na internet, seja na forma de microblog, ou de várias outras formas que só a liberdade de ter seu próprio cantinho na internet pode proporcionar.
Uma parte importante do Twitter era como ele era bom em trazer informações relevantes ou pensamentos de pessoas que você se importa, apesar de todos os problemas que vinham junto com esse conteúdo útil. Ainda não encontrei uma solução perfeita pra isso, mas tenho tentado alternativas como o Artifact (apesar de não gostar muito da abordagem algorítmica dele), ou o bom e velho RSS através de aplicações como Feedly, Omnivore, ou Readwise Reader (ainda não escolhi qual dos três usar definitivamente).
As vezes ainda dá vontade de voltar ao Twitter pra gritar no vazio sobre minhas frustrações, ou fazer aquele comentário sobre o jogo do Manchester United que aparece totalmente sem contexto pros meus seguidores. Mas com o tempo estou vendo que isso não faz sentido pra nenhuma das partes envolvidas nessa situação: é muito melhor passar meu tempo comentando sobre Formula 1 no grupo do Telegram que acompanha formula 1, falar de futebol com os amigos que se importam com futebol, compartilhar música com quem talvez tenha interesse de ouvir ou só sentar fermentando meus pensamentos até eles evoluírem para algo melhor que um impulso em forma de 280 caracteres. Os laços que eu fiz no site podem continuar vivendo em locais mais apropriados para conversa, enquanto as propagandas, postagens exageradas e conteúdos que eu não tenho interesse em acompanhar podem viver em outro lugar. Ou até mesmo ficar no X. Contanto que não encham minhas cabeça de mais informação do que eu preciso (e honestamente, aguento) processar.